Após o excelente e inesperado resultado do primeiro
Homem de Ferro,
Jon Favreau despontou como diretor, mas quando o segundo episódio chegou aos cinemas, uma coisa ficou evidente: era
Robert Downey Jr. quem carregava o projeto nas costas graças a sua atuação na pele de Tony Stark. Não que a direção deixasse de ter seus méritos, mas sem o ator,
Homem de Ferro talvez não tivesse alcançado tamanho sucesso.
NOTA: 60
Cowboys and Aliens - TRAILER
Foi então que o cineasta decidiu
abandonar a franquia para comandar o projeto intitulado Cowboys &
Aliens, inspirado em uma HQ que nem havia sido lançada. Agora que a película
faz sua estreia, Favreau comprova que está longe de ser um diretor tão inventivo
quanto se pressupunha.
No filme, acompanhamos a história
de Jake Lonergan (Daniel Craig), que acorda ferido e sem memória no meio
do deserto do Novo México. Assim que Lonergan alcança a cidade de Absolution, a
vida de seus moradores muda drasticamente quando um ataque de alienígenas
acontece e muitos são abduzidos. Com o auxílio de uma misteriosa mulher, Ella
(Olivia Wilde), e de um rico fazendeiro local, Woodrow Dolarhyde
(Harrison Ford), o cowboy decide resgatar aqueles que foram capturados na
esperança de lembrar seu passado.
Assim que o filme tem início, somos
apresentados a Jake Lonergan, um personagem bruto e sem limites que é encarnado
por Daniel Craig com a mesma vitalidade conferida ao seu James Bond. Na
verdade, com exceção da poeira e do chapéu, em pouco podemos diferenciar o
cowboy do agente secreto, já que o ator se resume a repetir o charme e a
intensidade física aplicados ao seu outro papel. Assim, apesar de ser o centro
do enredo, Lonergan jamais envolve o espectador, principalmente se levarmos em
conta que a história que remonta de seus flashbacks é pouco inspirada e
extremamente previsível. Já Harrison Ford, que tinha a grande chance de
chamar a atenção para sua composição de Dolarhyde, pouco consegue ao ser
sabotado pelo roteiro que lhe concede um personagem aborrecido, surgindo em cena
sempre com a cara amarrada. Se levarmos em conta que muitas de suas cenas se
passam no escuro, a coisa fica ainda pior. Ainda na esperança que a beleza de
Olivia Wilde salvasse o trio principal, ficamos a ver navios, já que Ella
é a persona mais despropositada de Cowboys & Aliens, chegando até a
agir como um deus ex-machina em determinado ponto da projeção apenas para
justificar a fluidez da história. Não que o roteiro escrito a cinco mãos deixe
de tentar explicar quem é aquela mulher, mas isso nunca convence o público de
fato, e pior, acrescenta uma pitada de fantasia a uma mistura que não
necessitava de mais elementos. Em dado instante, achei que dragões, fadas e
elfos surgiriam na tela.
O único que se sobressai é o sempre
excelente Sam Rockwell, que prova sua versatilidade ao assumir um
personagem covarde e franzino, mas que, infelizmente, é escanteado a simples
coadjuvante. Mas se o script de Roberto Orci, Alex Kurtzman e
companhia falha ao desenvolver seus personagens, recaindo em clichês, ao menos
cresce quando tem que colocá-los frente a frente, fazendo com que os primeiros
vinte minutos da sessão sejam os mais interessantes. A apresentação de
Absolution e os pequenos dramas particulares gerados são eficientes, tornando o
"Cowboys" do título infinitamente mais interessante que o
"Aliens". A recriação da época é feita com primor pela figurinista
Mary Zophres e pelos designers de produção Scott Chambliss e
Russell Bobbitt, pois em nenhum momento desconfiamos estar em outro lugar
que não o Velho Oeste.
Pena que a fotografia de Matthew
Libatique, excelente em Cisne Negro, não seja tão bem conduzida,
oscilando entre momentos bem pensados, como quando o rosto de Lonergan é
encoberto assim que ele alcança Absolution, evidenciando sua personalidade
obscura e seu deslocamento em relação aos habitantes, e outros que só atrapalham
a experiência cinematográfica, como muitas cenas que se passam no escuro e
revelam pouco das faces dos personagens que acompanharemos durante todo o filme.
Com isso, o cinegrafista e seu diretor acabam afastando qualquer possibilidade
de envolvimento que o espectador possa ter para com esses. Por outro lado, os
flares - reflexos luminosos - aparecem organicamente na trama, ao contrário do
que acontece na maior parte da filmografia de J.J. Abrams, vide o
recente Super 8. Piscando rapidamente na tela, o recurso compõe de forma
interessante as luzes usadas pelas naves extraterrestres, estabelecendo um
contraponto com as cores mais ardentes do deserto que cerca Absolution. E mesmo
a clássica cena do bar é bem explorada quando Libatique brinca com tons
avermelhados, indicando não só o perigo iminente da situação como servindo de
metáfora para o ambiente promíscuo, onde a bebida predomina e os caracteres se
chocam.
Já Harry Gregson-Williams
escapa, enfim, do círculo vicioso no qual havia se metido. Desde Cruzada,
de Ridley Scott, o compositor parecia não querer se desprender de
determinados acordes que se repetiam, por exemplo, em As Crônicas de Nárnia:
Príncipe Caspian. Em Cowboys & Aliens, a música surge
diferenciada e mais sutil, contudo não escapa dos percalços que outros aspectos
técnicos da produção sofrem. Se em princípio parecia que teríamos uma trilha
instrumental diferenciada, que mesclaria o ritmo do Velho Oeste com as batidas
do rock, logo Gregson-Williams abandona a possibilidade e recai no lugar-comum.
Assim, as chances de fugir do estereótipo culminam numa trilha apagada,
demonstrando que quando não se entrega àquilo que sabe, Gregson-Williams apenas
se perde.
Mas nem tudo cheira mal em
Cowboys & Aliens. Apesar dos problemas latentes, há o que ser
apreciado em tela, como por exemplo, os planos abertos que Favreau cria ao
mostrar o deserto do Novo México. As paisagens são belas e os personagens,
beneficiados pela maquiagem, incorporam com facilidade a vida naquela região
inóspita. Repare como o enredo faz questão de retratar a ignorância da época,
mesmo que de forma fabulesca, ao fazer com que um pastor informe que as naves
batem com a descrição dos demônios da Bíblia. Enquanto isso, a boa edição de som
permite que o público mergulhe nos sons discrepantes daquele universo que mescla
o atraso da humanidade com a tecnologia dos extraterrestres. Numa cena que se
passa em um navio, os ruídos da chuva e estalidos da estrutura ajudam a compor
uma ambientação verossímil e uma situação tensa. Cowboys & Aliens
ainda conta com as criaturas do espaço mais interessantes desse ano, diferentes
daquelas mostradas em Super 8 e Invasão do Mundo: Batalha de Los
Angeles, já que são seres mais funcionais e com uma personalidade bem
delineada. Longe de alcançarem o posto de melhores extraterrestres do cinema, no
mínimo soam poderosos e ameaçadores.
Assim, num típico aventurão para
ser visto com pipoca e refrigerante, pelo menos podemos contar com um diretor
que é honesto não só consigo mesmo como com seu público, já que nos entrega uma
história objetiva que não pretende ser mais que isso, e tal característica se
reflete em seu personagem principal que comumente opta por decisões ágeis e
pouca enrolação. Contando com bons efeitos visuais e um ritmo de ação vibrante,
mesmo que sem surpresas, Cowboys & Aliens consegue divertir sem
deixar de ser apenas um filme mediano que comprova que nem sempre excelentes
conceitos rendem boas histórias.